Quinta-feira, 1 de Março de 2012
Portugal registou em 2011 a sua maior apreensão anual de aves ilegais de sempre, com a descoberta de 150 ovos que cruzaram o Oceano Atlântico de avião, colados ao corpo de "correios" contratados por traficantes.
Segundo fonte do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), os ovos foram apreendidos em seis momentos diferentes e eram de espécies da América do Sul.
Um terço dos animais não sobreviveu à viagem.
Os papagaios, tucanos e araras transportados, alguns deles em risco de extinção, possuem valor de mercado entre 500 euros e 70 mil euros cada um, segundo João Loureiro, coordenador da Unidade de Aplicação das Convenções Internacionais do ICNB.
"Apesar do aumento das apreensões, sabemos que a quantidade descoberta não representa nem 10 por cento do que chega ao país", afirma Loureiro.
Portugal é uma das principais portas de entrada do tráfico de animais recolhidos na América do Sul e levados para a Europa. Essa rota acaba por ser bastante utilizada devido ao grande número de voos provenientes do Brasil.
Espanha e alguns países do Leste Europeu também são usados pelos traficantes.
O tráfico de animais movimenta cerca de 10 mil milhões de dólares ao ano (7,5 mil milhões de euros) e é hoje o terceiro maior comércio ilegal, atrás somente do de armas e do de drogas, de acordo com a Secretaria da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas (Cites), que tem sede em Genebra.
"Na maioria das vezes é usada a mesma rota para o tráfico de drogas e o de animais e, em muitas delas, é o mesmo grupo que faz as duas coisas", diz Liliane Garcia Ferreira, promotora de São Paulo e oficial de apoio na Cites.
João Loureiro afirma, inclusive, que traficantes de drogas usam os animais ilegais para branquear o dinheiro do tráfico. Outro motivador do comércio ilegal, diz, é a alta procura europeia por animais de companhia, que supera a quantidade disponível no mercado legal.
E a fiscalização do comércio de animais é bastante difícil. Os ovos, transportados enrolados em meias e amarrados à barriga dos "correios", não são detetados pelos aparelhos de raios-X nos aeroportos. A isso Loureiro atribui as pequenas apreensões dos anos anteriores, que não passavam de 50 ovos por ano.
Para barrar esse tráfico, a Cites trabalha na capacitação e formação das autoridades responsáveis de diversos países. Na América do Sul, há a Organização do Tratado de Cooperação Amazónica, que também actua na preservação das espécies.
João Loureiro explica que, em Portugal, a legislação se tornou mais restritiva para impedir tanto a entrada do animal ilegal como a sua reprodução.
A espécie criada em cativeiro legalmente é sempre identificada por uma marca e por um documento de origem. Os proprietários também precisam de um registro específico.
O aumento das apreensões de aves exóticas comercializadas ilegalmente tem causado a lotação dos parques portugueses, já que problemas sanitários impedem que elas sejam enviadas de volta aos países de origem.
"Ficamos com os animais e gastamos dezenas de milhares de euros com eles todos os meses, sem ter uma mais-valia", afirma João Loureiro, coordenador da Unidade de Aplicação das Convenções Internacionais do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade.
Os 90 animais que sobreviveram às apreensões no ano passado estão em parques e zoológicos, mas não são expostos ao público.
O regresso desses animais ao país de origem ainda não é possível devido a barreiras sanitárias para a prevenção da gripe aviária, mas o problema está a ser estudado, segundo Loureiro.
E o desequilíbrio não é causado somente no país receptor do tráfico. O ecossistema de onde esses animais são retirados também acaba prejudicado, assim como as comunidades locais.
Um exemplo é o galo das serras do Pará (Rupicola rupicola), que não existe no mercado legal por estar em risco de extinção no seu habitat natural. Entre as apreensões do ano passado, no entanto, foram encontrados ovos da espécie e nenhuma das aves sobreviveu.
A retirada dos animais do seu ambiente é, geralmente, feita por pessoas em más condições financeiras, contratadas pelos traficantes.
Podem ser tanto moradores de aldeias, indígenas, ou europeus, que ganham uma viagem de poucos dias à América do Sul, algo que não poderiam pagar, e voltam com os ovos junto ao corpo.
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